Recentemente houve progresso em tecnologias que aumentam a acurácia do diagnóstico e estadiamento do câncer de próstata, todavia ainda é controversa a escolha da abordagem terapêutica apropriada para cada perfil de paciente, sobretudo pelo questionamento do real benefício na redução de mortalidade de tratamentos radicais, como prostatectomia (PT) ou radioterapia (RT).
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Estudos prévios sugeriram que, embora possa haver benefício na redução de metástase e progressão de doença, não houve diferença de mortalidade utilizando essas abordagens comparativamente à vigilância ativa (VA). Por isso, houve mudança em guidelines com indicação da não realização de antígeno prostático específico (PSA) de rotina em 2012 seguida da recomendação de individualização e compartilhamento na decisão de realizar screening em 2018 (U.S. Preventive Services Task Force). Tal medida, embora tenha elevado a incidência de diagnóstico em estágios avançados, não modificou a sobrevida. Esse dado reacendeu o questionamento sobre o real benefício do tratamento radical, considerando seus potenciais efeitos adversos, independente da estratificação de risco do paciente.

Estudo sobre diferença de mortalidade no tratamento para câncer de próstata
Buscando elucidar essa questão um estudo britânico publicado recentemente no New England Journal of Medicine avaliou 1.643 pacientes com diagnóstico de câncer de próstata durante período médio de 15 anos. Foram sublocados randomicamente em 3 grupos terapêuticos: VA (N=545), PT (N=553) e RT (N=545). Os parâmetros avaliados foram morte em decorrência do câncer de próstata (desfecho primário), morte por outras causas, presença de metástase (confirmada por imagem ou PSA ≥ 100 ng/ml), progressão de doença e uso de terapia de deprivação androgênica (TDA) (desfechos secundários). Em relação à estratificação dos pacientes, 77,2% eram ISUP 1 (Gleason 3+3 = 6) e 76% tinham estadiamento T1c.
Resultados
A mortalidade geral por câncer de próstata foi de 2,7% (N=45), sendo 3,1% (N=17), 2,2% (N=12) e 2,9% (N= 16) nos grupos VA, PT e RT, respectivamente, não havendo diferença estatisticamente significativa entre os grupos. Mortalidade por outras causas foi de 356 pacientes (21,7%) com distribuição similar entre os grupos, sendo 31,8% por doenças do sistema cardiorespiratório e 51,6% por outras neoplasias. Metástase foi diagnosticada em 104 pacientes (6,3%), sendo 51 (9,4%) no grupo VA, 26 (4,7%) no grupo PT e 27 (5%) no grupo RT. Progressão de doença foi detectada em 15,8% (N= 259), tendo a maioria ocorrido no grupo VA (N = 141; 25,9%). Já TDA foi iniciada em 69 (12,7%), 40 (7,2%) e 42 (7,7%) pacientes do grupo VA, PT e RT, respectivamente.
Foram realizadas análises adicionais utilizando como parâmetro a idade, em que pacientes com idade abaixo de 65 anos submetidos à PT ou VA tiveram risco relativo de morte menor que aqueles submetidos à RT. Já em pacientes com idade maior que 65 anos, VA esteve associada ao risco maior de morte. Não houve diferença de mortalidade associada ao nível de PSA basal ou estratificação do paciente (gleason e estadiamento T).
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Conclusão
Em resumo, o presente estudo demonstrou que a mortalidade por câncer de próstata a longo prazo mantém-se baixa tanto em pacientes submetidos ao tratamento radical como naqueles seguidos apenas com vigilância.
Mensagem prática
O tratamento do câncer de próstata deve ser individualizado considerando-se não somente o estadiamento da doença, mas principalmente ponderando os potenciais benefícios e riscos advindos da abordagem escolhida. A evidências atuais sugerem abordagens menos invasivas, as quais reduzem efeitos adversos sem interferir na mortalidade.
Autoria

Nathália Ribeiro Pinho de Sousa
Residente em Cirurgia Geral pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal da Fronteira Sul ⦁ Especialização Multiprofissional em Atenção Básica em Saúde pela Universidade Federal de Santa Catarina ⦁ Médica pela Universidade Federal do Ceará ⦁ Exerceu cargo de Presidente do Departamento Brasileiro das Ligas Acadêmicas de Cirurgia Cardiovascular ⦁ Foi editora Júnior do Blog do Brazilian Journal of Cardiovascular Surgery ⦁ Desempenhou função de vice-presidente do Departamento Brasileiro das Ligas Acadêmicas de Cirurgia Cardiovascular e de presidente da Liga de Cirurgia Cardiovascular da Universidade Federal do Ceará ⦁ Realizou estágio em Cirurgia Cardíaca na Cleveland Clinic (EUA), Mount Sinai Hospital (EUA), The Heart Hospital at Baylor Plano (EUA), Hôpital Européen Georges Pompidou (França), Herzzentrum Leipzig (Alemanha), Papworth Hospital (Inglaterra), Harefield Hospital (Inglaterra), St. Thomas Hospital (Inglaterra), Manchester Royal Infirmary (Inglaterra), Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (Brasil) e Hospital São Raimundo (Brasil) ⦁ Realizou estágio de pesquisa no William Harvey Heart Centre (Inglaterra) ⦁ Foi bolsista de Graduação Sanduíche pelo Programa Ciência sem Fronteiras na University of Roehampton, Londres ⦁ Foi bolsista de iniciação científica CNPq, UFC e da FUNCAP do Laboratório de Fisiologia da Inflamação e do Câncer (LAFICA).
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