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Infectologia21 setembro 2023

Sinusite aguda na infância deve ser tratada com antibiótico?

Recentemente foi publicado um artigo na revista JAMA sobre uso de antibiótico para tratamento de sinusite aguda na infância.

A sinusite aguda e as infecções de vias aéreas superiores (IVAS) de etiologia viral têm manifestações clínicas semelhantes, o que pode dificultar o diagnóstico acurado e levar ao uso excessivo de antimicrobianos. Com este problema em mente, pesquisadores dos Estados Unidos realizaram um estudo clínico randomizado duplo-cego controlado por placebo com o objetivo de buscar preditores que identifiquem quais crianças têm maiores chances de se beneficiar de tratamento antimicrobiano.

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Sinusite aguda na infância deve ser tratada com antibiótico

Metodologia

Durante 6 anos, entre fevereiro de 2016 e abril de 2022, foram recrutadas crianças americanas de 6 instituições primárias de saúde. Os pacientes incluídos deveriam ter entre 2 e 11 anos de idade e ter sido diagnósticos com sinusite aguda a partir dos critérios clínicos de definição na doença pela Academia Americana de Pediatria (AAP):

  • Sintomas persistentes:
    • Presença de sintomas nasais, como coriza e obstrução nasal e/ou tosse.
    • Duração de 11-30 dias sem sinais de melhora.
  • Sintomas evoluindo com piora:
    • Presença de sintomas nasais, como coriza e obstrução nasal e/ou tosse.
    • História de melhora inicial seguida de piora dos sintomas nasais, tosse diurna ou início de febre entre 6 e 10 dias do início da doença em crianças que pareciam estar se recuperando.

Crianças com sinusite aguda grave (secreção nasal purulenta associada a febre > 39 °C por 3 ou mais dias), com outra infecção concomitante ou com comorbidades como fibrose cística, imunodeficiência e discinesia ciliar, foram excluídos.

As crianças participantes foram estratificadas em subgrupos a partir da presença ou ausência de secreção nasal purulenta e foram divididas para que recebessem amoxicilina + clavulanato na dose de 90 mg/kg/dia de amoxicilina em duas doses diárias ou placebo.  Os responsáveis pela criança foram instruídos a preencher diariamente um formulário eletrônico para acompanhamento dos sintomas.

A qualquer momento, caso os pais demonstrassem preocupação ou a criança apresentasse manifestações compatíveis com falha terapêutica, o paciente seria avaliado presencialmente por um médico envolvido no estudo e decisões clínicas subsequentes seriam tomadas sem comprometer o mascaramento.

Os pesquisadores também procederam com coleta de material para cultura para bactérias (P. pneumoniae, M. catarrhalis e H. influenzae).

Resultados

Foram atendidas 2.923 crianças no período, sendo randomizados 510 pacientes que preenchiam os critérios de inclusão. A maior parte destas crianças tinha entre 2 e 5 anos de idade, apresentava sintomas há mais de 10 dias (apresentação persistente) e não tinha história de rinite alérgica ou asma.

Através das culturas, os pesquisadores foram capazes de identificar crescimento bacteriano em 71% das amostras. Havia história de secreção nasal purulenta em 67% dos pacientes, não sendo identificada correlação significativa entre coloração da secreção e crescimento bacteriano nas culturas. Os pesquisadores também realizaram uma análise exploratória metatranscriptômica que sugeriu que os maiores benefícios com o uso do antibiótico foram identificados nos pacientes colonizados por S. pneumoniae e H. influenzae, totalizando 47% dos pacientes.

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As crianças randomizadas para fazer uso de amoxicilina + clavulanato apresentaram redução significativa no incômodo gerado pelos sintomas. A mediana de tempo de melhora dos sintomas foi de 7 dias para os pacientes em uso do antibiótico versus 9 dias para as crianças em uso de placebo. Também foi observado que no grupo da amoxicilina + clavulanato, o risco de falha terapêutica ou complicações (otite média e necessidade de antibiótico venoso) foi significativamente menor.

Não foram descritos efeitos adversos importantes, mas diarreia ocorreu com maior frequência no grupo dos pacientes em uso de antibiótico (11,4% vs 4,7%).

Conclusões

Atualmente, existe uma grande preocupação com o uso indiscriminado de antibióticos, especialmente na faixa etária pediátrica. Embora o protocolo da AAP sobre diagnóstico e tratamento da sinusite aguda em crianças contemple a recomendação de observação clínica, grande parte dos médicos prescreve antibiótico imediatamente.

O estudo realizado sugere que a investigação de colonização bacteriana em nasofaringe, especialmente S. pneumoniae e H. influenzae, tem capacidade de predizer quais pacientes teriam maior benefício com o tratamento antimicrobiano e reduzir em até 53% o uso de antibiótico a partir do diagnóstico clínico da sinusite aguda.

Fatores dificultadores desta abordagem incluem a necessidade de realização de swab nasal em crianças pequenas, o que pode ser considerado invasivo para algumas famílias, e a disponibilidade dos testes, além do tempo para liberação dos resultados e a dinâmica de atendimento em serviço de urgência, o que prejudica a revisão da terapêutica.

A partir disso, os autores sugerem 4 possíveis abordagens nos quadros de sinusite aguda:

  • Tratamento presuntivo de todos os pacientes;
  • Tratamento presuntivo e realização de cultura de nasofaringe, suspendendo o antibiótico em caso de resultado negativo-Realização de cultura e indicação de antibiótico apenas nos pacientes positivos;
  • Abordagem expectante.

Destaca-se ainda que a presença ou ausência de secreção nasal purulenta não tem a capacidade de identificar as crianças que poderiam ou não se beneficiar de antibiótico.

Comentários

O estudo traz uma abordagem interessante e com potencial capacidade de reduzir em até 50% o uso de antibióticos em pacientes pediátricos com sinusite.

Considerando que, após o fim do isolamento social que ocorreu no contexto da pandemia da covid-19, parece ter havido um grande aumento de IVAS de etiologia viral na população infantil e que esses quadros por vezes se sobrepõem, dificultando ainda mais o diagnóstico clínico da sinusite bacteriana, a estratégia sugerida pelos autores é bastante animadora.

Infelizmente, por questões logísticas, de tempo de resultado e disponibilidade desses testes, será difícil o uso abrangente dessa abordagem, especialmente no contexto dos serviços de pronto-atendimento. No entanto, no que tange o atendimento ambulatorial, a coleta de cultura de nasofaringe para embasamento terapêutico pode ser não apenas viável, mas bastante proveitosa.

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Referências bibliográficas

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