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Infectologia8 dezembro 2023

Hepatite D: o que o médico deve saber?

A hepatite D é uma hepatite viral decorrente de um vírus defectivo, que depende da infecção pelo vírus da hepatite B para se replicar.

O vírus da hepatite D (HDV) é um vírus RNA, que depende do vírus da hepatite B (HBV) para infectar os hepatócitos e replicar. Afeta cerca de 12 a 72 milhões de pessoas no mundo.  

A infecção por esse vírus pode ocorrer de 2 formas: 

  • Coinfecção: Infecção aguda pelos vírus HBV e HDV.  
  • Superinfecção: Infecção pelo HDV em paciente com hepatite B crônica.  

Veja também: Retrospectiva 2023: o que abordamos sobre HIV/AIDS no Portal?

hepatite D

Epidemiologia

A infecção por HDV é mais prevalente em países da África Subsaariana, Ásia Central e Europa Oriental, especialmente em Benin, Gabão, Mauritânia, Nauru e Mongólia. 

Existe maior prevalência da infecção pelo HDV em alguns grupos, como: pacientes com doença hepática avançada, usuários de drogas injetáveis, profissionais do sexo, homens que fazem sexo com homens, pacientes em hemodiálise e pessoas que vivem com HIV. 

Prevenção

A coinfecção pode ser prevenida através da vacinação universal contra hepatite B. Sabe-se que a combinação de vacina contra hepatite B e imunoglobulina contra hepatite B para recém-nascidos de mães infectadas por HBV e HDV reduz a transmissão do vírus da hepatite B e, por consequência, da hepatite D.  

Todavia, não existe vacina eficaz em proteger a superinfecção nos indivíduos com hepatite B crônica. Recomendam-se medidas para prevenir transmissão parenteral e sexual. 

Manifestações clínicas

Coinfecção: Pode se manifestar como hepatite aguda, com maior risco de insuficiência hepática do que na infecção por hepatite B isolada. Existe tendência à clareamento viral, em cerca de 95% dos casos. 

Superinfecção: Pode se manifestar como uma hepatite aguda em paciente com hepatite B crônica desconhecida ou exacerbação de doença hepática crônica em pacientes sabiamente infectados. Geralmente cursa com infecção crônica pelo HDV em 90% dos casos, demonstrada por carga viral positiva por mais de 6 meses. O HDV interfere com a replicação do HBV-DNA, no geral, cursando com baixo nível sérico de HBV-DNA.  Cursa com progressão mais rápida para cirrose hepática e aumentando a mortalidade por descompensação de doença hepática e por carcinoma hepatocelular (CHC). 

Existem fatores associados a pior prognóstico, como: genótipo do HDV (genótipo 1); níveis séricos elevados de HBV-DNA; uso de álcool (> 2 doses/dia em homens e > 1 dose/dia em mulheres); obesidade e diabetes. 

Estudos demonstram um risco aumentado de CHC nessa população 1,3 a 2,8 vezes maior que na hepatite B crônica isolada.  

Diagnóstico

  • Co-infecção (aguda)

Presença de HbsAg, anti Hbc IgM e RNA HDV. Anti -HDV IgM e IgG podem demorar meses para serem detectados. Avaliar outras causas de hepatites agudas.  

Recomenda-se dosar a carga viral de HDV em pacientes com hepatite B aguda, principalmente se insuficiência hepática aguda e/ou fator de risco para infecção de HDV. 

  • Superinfecção (crônica)   

Pacientes com hepatite B previamente diagnosticada (HbsAg, anti Hbc IgG) que apresentem elevação de ALT ou exacerbação da doença hepática devem ser testados para hepatite D (triagem com anti-HDV e confirmação com HDV-RNA). Além disso, devem ser avaliadas outras causas como hepatites A e C, hepatite autoimune, lesão hepática induzida por drogas, uso de álcool, etc. 

Os pacientes devem ainda ser testados para outras infecções, como: hepatite A, hepatite C, HIV. Devem também ser estratificados em relação ao grau de fibrose, através de escores como APRI e FIB 4 e de métodos não invasivos como elastografia hepática. A biópsia hepática é um método invasivo, ainda considerada como padrão-ouro, sendo no geral reservada para dúvida diagnóstica. 

Screening

A diretriz americana (AASLD) recomenda testar pacientes com HbsAg positivo, com alto risco de infecção por hepatite D, incluindo: coinfectados com HIV, usuários de drogas injetáveis, homens que fazem sexo com homens e imigrantes de áreas com alta endemicidade. Já a sociedade europeia recomenda rastreio universal. Todavia, estima-se que a infecção por HDV é subdiagnosticada, visto baixas taxas de triagem tanto nos EUA (9-13%), quanto na Europa (8-35%).  

Leia ainda: Hepatite C na população negra dos EUA

Tratamento

O objetivo do tratamento é reduzir evolução para cirrose, descompensação de doença hepática, incidência de CHC e mortalidade por causa hepática, através da inibição da replicação do HDV.   

Pacientes com hepatite D crônica com elevação de ALT e/ou evidência de doença hepática compensada devem ser considerados para tratamento antiviral (interferon alfa ou bulevertida).   

Interferon α atua inibindo replicação e ativando resposta imunológica contra o HDV, com alguns estudos demonstrando maior clearence viral ao final do tratamento com essa droga. Todavia, apresenta diversos eventos adversos, como: fadiga, depressão, citopenias hematológicas, risco de exacerbação de doenças autoimunes subjacentes. Esse medicamento é contraindicado em pacientes com doença hepática descompensada, pois pode precipitar exacerbação da doença e predisposição a infecções graves.  

O interferon λ é capaz de induzir atividade antiviral semelhante ao interferon α, com menor incidência de efeitos colaterais. Existem estudos em fase 2 favoráveis a seu uso na hepatite D.  

Bulevirtida é um lipopeptídeo que atua bloqueando a interação entre HDV e hepatócitos, administrado via subcutânea diariamente. Apresenta boa tolerância.  Estudos em fase 2 mostraram que até 77% dos pacientes alcançaram um declínio de 2 log ou mais após 24 semanas de bulevirtida em monoterapia, com taxas de sucessos maiores em comboterapia com interferon α peguilado.  

Existem outras drogas em desenvolvimento como lonafarnib em combinação com ritonavir e terapia gênica. 

Saiba mais: Fatores de risco e desfechos de infecção por SARS-CoV-2 em pessoas vivendo com HIV

Mensagens práticas

A hepatite D é uma hepatite viral decorrente de um vírus defectivo, que depende da infecção pelo vírus da hepatite B para se replicar. A infecção pelo HDV pode ocorrer de forma concomitante ao HBV (coinfecção) com tendência à clearence viral ou pode ocorrer em pacientes com hepatite B crônica (superinfecção), com tendência à cronificação e pior prognóstico. 

Apesar dos esforços de rastreamento dessa doença pelas sociedades de hepatologia, estima-se que seja uma infecção subdiagnosticada. Dessa maneira, há pouco arsenal terapêutico disponível. 

O maior conhecimento dessa condição permite diagnóstico adequado, devendo motivar mais estudos para o tratamento da hepatite D crônica. 

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Referências bibliográficas

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