Quando estamos decidindo sobre uma medicação a ser prescrita ao paciente, um momento importante é aquele em que pensamos sobre as interações medicamentosas da substância nova com os tratamentos em curso. Inibição enzimática, grau de ligação com proteínas plasmáticas e interação com medicações com mecanismo farmacológico similares são questões que precisamos nos atentar1-5.
A paroxetina é um antidepressivo pertencente à classe dos inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS) utilizada para o tratamento do transtorno depressivo maior, transtorno do pânico, transtorno disfórico pré-menstrual e transtorno de ansiedade social na população adulta1.
Ela é metabolizada no fígado pela enzima do citocromo P450 2D6 (CYP2D6) e 3A4 (CYP3A4)2. Aproximadamente, dois terços da paroxetina ingerida é eliminada pelos rins2. O metabolismo e a farmacocinética da paroxetina são fortemente afetados por sua alta ligação às proteínas plasmáticas e seu perfil de interação com as enzimas do citocromo P4502.
As interações medicamentosas da paroxetina podem ser divididas em três grupos considerando sua farmacocinética e metabolismo.

Relacionadas à ligação proteica
- A paroxetina em concentrações terapêuticas apresenta ligação com as proteínas plasmáticas superior a 95% (a fluoxetina também apresenta 95% de ligação com as proteínas plasmáticas)2. A administração concomitante da paroxetina com outras medicações com forte ligação a proteínas plasmáticas, como varfarina e digitoxina, pode causar mudança na concentração plasmática destas medicações levando a efeitos adversos2.
Inibição de CYP2D6
- A CYP2D6 é extremamente importante para a prática clínica por ser responsável pela metabolização de 20-25% de todas as medicações utilizadas3. Muitas medicações são inibidoras competitivas da enzima, levando a interações medicamentosas graves por impedir completamente a metabolização de outras substâncias3. Particularmente na psiquiatria é preciso estar atento a esse problema, porque a maioria dos antidepressivos e antipsicóticos são potentes inibidores da CYP2D63.
- A inibição da CYP2D6 pode aumentar a concentração plasmática de drogas metabolizadas por essa enzima, como antidepressivos tricíclicos (amitriptilina, nortriptilina, imipramina), neurolépticos fenotiazínicos (perfenazinna e tioridazina), risperidona, atomoxetina e antiarrítimicos, como propafenona e metropolol3. Uma interação particularmente importante da paroxetina é com tamoxifeno, uma vez que, graças à inibição da CYP2D6, há a redução do nível do metabólito ativo do tamoxifeno, o endoxifeno, culminando em perda de eficácia da medicação1.
- Os níveis da paroxetina também podem ser alterados por medicação que inibem a CYP2D6, como cimetidina e fenitoína, diminuindo seu efeito terapêutico2.
Drogas serotoninérgicas
- Da mesma forma que ocorre com outros ISRSs, a administração simultânea da paroxetina com drogas serotoninérgicas pode levar a aumento de efeitos associados à serotonina1. Algumas combinações são contraindicadas, como uso concomitante de paroxetina com IMAO, linezolida e azul de metileno1. O uso simultâneo de drogas serotoninérgicas pode aumentar o risco de síndrome serotoninérgica1, evento de extrema importância clínica, sobre o qual vamos falar um pouco mais.
Síndrome serotoninérgica
A síndrome pode ser causada por diversas medicações, tanto em dose terapêuticas, quanto em intoxicações e overdose ou através de interação entre dois ou mais agentes serotoninérgicos (que é a causa mais frequente)4. A combinação de tramadol + ISRS é a causa mais comum da síndrome4.
Especial atenção deve ser dada na realização de trocas cruzadas5. O período de washout das medicações dependem da sua meia-vida5. No caso da paroxetina, seu estado estacionário é usualmente atingido entre uma e duas semanas. Assim, é necessário esperar duas semanas após a interrupção da paroxetina antes de começar outras medicações que interajam com ela, como os inibidores da monoaminoxidade2.
A seguir, as medicações com ação serotoninérgicas agrupadas conforme o mecanismo de ação.

A tríade clássica da síndrome consiste em disfunção autonômica (diaforese, taquicardia, náuseas e vômitos, midríase, aumento de peristaltismo e diarreia), excitação neuromuscular (mioclonus, hipertermia, hipertonicidade, rigidez, clônus induzido, clônus ocular – oscilações rítmicas contínuas do olhar – e tremor) e alteração de estado mental (confusão, agitação, ansiedade, letargia e coma)5.

Contudo esses sintomas podem não ocorrer simultaneamente. Quarenta por cento dos pacientes apresentam disfunção autonômica, 50% apresentam excitação neuromuscular e 40% alterações do estado mental5.
O diagnóstico é clínico5. Os critérios de Hunter são a ferramenta clínica com melhor sensibilidade e especificidade5. Para o diagnóstico é necessário o uso de agente serotoninérgico associado a uma das características clínicas descritas a seguir:
- Espasmo clônico espontâneo
- Espasmo clônico induzido + agitação ou diaforese
- Espasmo clônico ocular + agitação ou diaforese
- Tremores + hiperreflexia
- Hipertonia mais hipertermia + espasmo clônico ocular ou induzido5.
Os diagnósticos diferenciais relevantes incluem síndrome neuroléptica maligna, toxicidade anticolinérgica, síndrome de descontinuação de medicações serotoninérgicas, intoxicação por drogas simpatomiméticas, hipertermia maligna, meningite e encefalite4.
As medicações serotoninérgicas devem ser descontinuadas na ocorrência da síndrome e tratamento de suporte, muitas vezes em unidade de terapia intensiva, é necessário4. Antagonistas serotoninérgicos, como ciproeptadina e clorpromazina, também são usados, mas as evidências que sustentam o uso são fracas4,5.
Autoria

Tayne Miranda
Médica pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Residência em Psiquiatria pela Universidade de São Paulo (USP). Mestranda em Psicologia Social pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Psiquiatra Assistente do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP).
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