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Psiquiatria19 maio 2025

Eficácia de antidepressivos na depressão associada ao infarto do miocárdio

Por Tayne Miranda

Um corpo crescente de evidências tem mostrado que a depressão pós infarto agudo do miocárdio (IAM) traz prejuízos para além da qualidade de vida, associando-se a piora de desfechos clínicos, aumentando a morbidade e mortalidade. Antidepressivos são comumente prescritos pós-IAM, com uma frequência de uso em torno de 6%, a despeito das preocupações quanto aos seus efeitos adversos cardíacos. Nesse sentido, a metanálise conduzida por Hongquan Wan e colaboradores buscou avaliar a eficácia e segurança dos antidepressivos na depressão após IAM. 

Métodos 

O estudo foi realizado de acordo com as diretrizes Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA). Artigos publicados até o final de outubro de 2024 nas seguintes bases de dados PubMed, Embase, Web of Science, Ovid, EBSCO e Cochrane Library foram avaliados. 

Foram incluídos ensaios clínicos randomizados e coortes prospectivas em adultos que utilizaram entrevistas estruturadas para diagnóstico de depressão considerando os critérios diagnósticos do DSM-5 e CID-10 ou escalas validadas (ex.: Inventário de Depressão de Beck (BDI) e Escala de Depressão de Hamilton (HAMD). Estudos avaliando Inibidores Seletivos de Recaptação de Serotonina (ISRS) e Antidepressivos Tricíclicos (TCA) foram priorizados. Estudos com outras classes de antidepressivos foram excluídos quando os dados foram insuficientes (<3 estudos por subgrupo). Os desfechos avaliados foram gravidade da depressão, mortalidade por todas as causas, reospitalização por doença cardíaca, intervenção coronária percutânea (ICP) de repetição e recorrência do IAM.  

Resultados 

12 estudos foram incluídos na metanálise. A gravidade da depressão no início do estudo foi comparável entre os grupos de tratamento com antidepressivos e os grupos controle (DMP combinada = -0,022, IC 95%: -0,087 a 0,044). No acompanhamento em longo prazo, oito estudos relataram que o tratamento com antidepressivos reduziu significativamente os escores de depressão (DMP combinada = -1,023, IC 95%: -1,671 a -0,375), embora tenha sido observada heterogeneidade significativa. A análise de sensibilidade confirmou a robustez desses achados, com o tratamento antidepressivo mostrando um efeito consistente na redução da gravidade da depressão após a exclusão de estudos individuais. 

A incidência geral de eventos cardíacos adversos não foi maior no grupo de tratamento em comparação ao grupo de controle (RR combinado = 0,893, IC 95%: 0,793–1,005). A incidência geral de eventos cardíacos adversos não foi maior no grupo de tratamento em comparação ao grupo de controle (RR combinado = 0,893, IC 95%: 0,793–1,005).  

O risco de reinternação por doença cardíaca foi avaliado em seis estudos, com heterogeneidade significativa (p < 0,001, I² = 96,6%). Na análise primária, o risco de reinternação não diferiu significativamente entre os grupos que receberam antidepressivos e os grupos controle (RR combinado = 1,070, IC 95%: 0,820–1,398). Após a análise de sensibilidade e exclusão de um estudo, o risco de reinternação não foi aumentado pelo tratamento com antidepressivos (RR combinado = 0,977, IC 95%: 0,913–1,045). 

Seis estudos avaliaram o efeito dos antidepressivos sobre o risco de IAM recorrente. Foi observada heterogeneidade significativa entre esses estudos, e os dados combinados sugeriram que o tratamento com antidepressivos não reduziu significativamente o risco de recorrência do IAM (RR combinado = 0,931, IC 95%: 0,374–2,316). No entanto, após a análise de sensibilidade e a exclusão de um estudo, que contribuiu significativamente para a heterogeneidade, a reanálise indicou que os antidepressivos reduziram significativamente o risco de recorrência de IAM (RR combinado = 0,787, IC 95%: 0,693–0,894). 

O efeito do tratamento antidepressivo sobre o risco de repetição da ICP foi avaliado em quatro estudos. Os antidepressivos não reduziram o risco de re-ICP (RR combinado = 1,011, IC 95%: 0,540–1,892), com alta heterogeneidade observada (p < 0,001, I² = 98,2%). Após a exclusão de um estudo, que foi o principal responsável pela heterogeneidade, a reanálise mostrou que os antidepressivos tiveram um efeito positivo na redução do risco de re-ICP (RR combinado = 0,858, IC 95%: 0,755–0,975). 

Embora os antidepressivos melhorem os sintomas depressivos, a associação com a redução da recorrência do IAM deve ser interpretada com cautela, devido aos possíveis fatores de confusão presentes em estudos observacionais. 

Discussão 

A depressão após IAM é sabidamente um fator de risco independente para pior prognóstico cardíaco. O presente estudo ressalta a importância clínica do tratamento com antidepressivos para melhorar o desfecho dos pacientes com depressão após IAM. Pacientes pós-IM comumente sofrem de depressão e ansiedade, o que compromete a adesão ao tratamento, a recuperação e a qualidade de vida geral. No entanto, devido à natureza atípica dos sintomas de depressão pós-IM, ela é pouco reconhecida pelos profissionais de saúde. O tratamento adequado da depressão pode reduzir a mortalidade de pacientes com depressão após IAM salientando a importância de que os médicos estejam capacitados para identificar e tratar a depressão pós-IAM, monitorando rigorosamente os sintomas e ajustando, quando necessário, o tratamento antidepressivo para melhorar o prognóstico do paciente. 

Os ISRS podem ser recomendados como tratamento de primeira linha para a depressão pós-IM, embora mais pesquisas sejam necessárias para confirmar seus benefícios a longo prazo e compará-los com antidepressivos mais recentes. 

Limitações 

  • 21 artigos foram excluídos por falta de acesso ao texto completo, o que pode ter causado um viés de seleção; 
  • O estudo não teve dados suficientes sobre os tipos específicos e dosagens de antidepressivos usados, impedindo análises de subgrupos; 
  • Somente ISRSs e mirtazapina foram incluídos na análise, limitando a generalizabilidade dos achados; 
  • Dependência de diferenças médias padronizadas (DMP) para combinar os escores de depressão, o que pode exagerar os tamanhos dos efeitos, bem como não fornece uma interpretação clinicamente intuitiva; 
  • Não avaliação de tolerabilidade ou a adesão ao tratamento para além dos eventos adversos. 

Impactos para a Prática Clínica 

  • O tratamento com antidepressivos foi associado com melhora dos sintomas depressivos e um perfil de segurança favorável na depressão após IAM; 
  • Os antidepressivos foram associados a uma redução do risco de recorrência do IAM e de procedimentos de revascularização; 
  • Os ISRS podem ser recomendados como tratamento de primeira linha para a depressão pós-IM, embora mais pesquisas sejam necessárias para confirmar seus benefícios a longo prazo e compará-los com antidepressivos mais recentes. 

 

Autoria

Foto de Tayne Miranda

Tayne Miranda

Médica pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Residência em Psiquiatria pela Universidade de São Paulo (USP). Mestranda em Psicologia Social pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Psiquiatra Assistente do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP).

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