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Hematologia15 outubro 2021

Diagnóstico de policitemia vera: conceitos importantes

Policitemia vera é uma síndrome mieloproliferativa caracterizada por aumento da massa eritrocitária. Saiba mais.

Policitemia vera (PV) é uma síndrome mieloproliferativa caracterizada por aumento da massa eritrocitária, associada à presença de mutação JAK2 e à morfologia medular característica.

policitemia vera

Critérios diagnósticos

Critérios maiores

  • Hemoglobina > 16,5 g/dL em homens ou > 16 g/dL em mulheres; ou hematócrito > 49% em homens ou > 48% em mulheres; ou massa eritrocitária > 25% do valor normal;
  • Morfologia medular hipercelular para a idade com hiperplasia das três séries (eritroide, granulocítica e megacariocítica), com megacariócitos anormais;
  • Presença de mutação JAK2.

Critério menor

  • Eritropoietina sérica baixa.

Para confirmação diagnóstica, é necessária a presença dos três critérios maiores ou a presença dos dois primeiros critérios maiores e do critério menor.

Valores de hemoglobina e hematócrito

Casos em que há forte suspeita clínica, porém sem preenchimento dos critérios diagnósticos necessários para síndromes mieloproliferativas, são classificados como neoplasia mieloproliferativa não classificada. Nesse grupo, há a chamada “PV mascarada”.

Por exemplo, do ponto de vista biológico, a documentação de aumento de hemoglobina e hematócrito em relação aos valores basais de um paciente, porém não atingindo os pontos de corte definidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), associada à presença de mutação JAK2, poderia ser manejada como possível policitemia vera. Outro exemplo seria a possibilidade de valores de hemoglobina e hematócrito subestimados por conta de esplenomegalia e hiperesplenismo.

Estudo de medula óssea

Segundo os critérios diagnósticos da OMS, a biópsia de medula óssea não é necessária em pacientes com policitemia sustentada (hemoglobina > 18,5 g/dL em homens ou > 16,5 g/dL em mulheres e hematócrito > 55,5% em homens ou > 49,5% em mulheres), se o terceiro critério maior e o critério menor estiverem presentes. No entanto, o exame é capaz de detectar fibrose em fase inicial, que é observada em até 20% dos indivíduos com policitemia vera e que prediz maior risco de progressão para mielofibrose pós-PV.

Sendo assim, muitos autores recomendam a realização de biópsia de medula óssea em todos os casos suspeitos de policitemia vera (salvo em determinadas situações), não apenas para confirmação diagnóstica, mas também para avaliação morfológica de base e citogenética, as quais têm implicações prognósticas. Uma exceção para a realização rotineira do procedimento seria indivíduos idosos com comorbidades graves, nos quais as informações adicionais obtidas com o estudo da medula não afetariam a escolha terapêutica.

Mutação JAK2

A mutação JAK2 é encontrada em virtualmente todos os casos de PV. No entanto, o achado não é patognomônico da condição, podendo ser detectado em 50-70% dos pacientes com trombocitemia essencial ou mielofibrose primária. A pesquisa pode ser feita tanto em sangue periférico quanto em medula óssea.

Na grande maioria dos pacientes (cerca de 97%), observa-se a mutação JAK2V617F (no éxon 14). Nos 3% restantes, ocorrem outras mutações, incluindo no éxon 12. Alguns guidelines recomendam solicitar a pesquisa da mutação nos éxons 14 e 12 concomitantemente, no início da investigação de policitemia, a fim de evitar atrasos no diagnóstico. No entanto, outros autores preconizam solicitar a pesquisa no éxon 12 apenas se a pesquisa da mutação JAK2V617F for negativa, evitando assim custos desnecessários para a maioria dos pacientes.

Muitos guidelines também orientam fazer a dosagem da eritropoietina sérica no momento na pesquisa da mutação JAK2. Dessa forma, o valor da eritropoietina já poderá nortear a investigação num segundo momento, caso a pesquisa da mutação seja inconclusiva, ou trazer informações adicionais, se a pesquisa se mostrar positiva. Os níveis de eritropoietina encontram-se baixos em mais de 85% dos pacientes com policitemia vera.

Passo-a-passo para diagnóstico

Na presença de valores de hemoglobina ou hematócrito acima de 16,5 g/dL e 49%, respectivamente, em homens ou de 16 g/dL e 48%, respectivamente, em mulheres, recomenda-se iniciar investigação com exames menos invasivos (pesquisa de mutação JAK2 e dosagem de eritropoietina sérica):

  • Se JAK2 não mutado e eritropoietina normal ou aumentada: diagnóstico de PV improvável;
  • Se JAK2 não mutado e eritropoietina baixa: diagnóstico de PV possível. Estudo de medula óssea é necessário para seguimento;
  • Se JAK2 mutado e eritropoietina normal: diagnóstico de PV possível. Estudo de medula óssea é necessário para seguimento;
  • Se JAK2 mutado e eritropoietina baixa: diagnóstico de PV provável. Estudo de medula óssea é recomendado para análise morfológica e citogenética.

Estratificação de risco

A sobrevida global dos pacientes com policitemia vera é inferior a da população geral. O principal fator prognóstico é a idade, porém outros fatores mostraram ter impacto prognóstico em diversos estudos, como leucocitose, trombose e cariótipo anormal. Análises recentes confirmam a impacto negativo (independente da idade) do cariótipo na taxa de sobrevida dos indivíduos com policitemia vera e ainda revelam que a presença de determinadas mutações não-JAK2 (como, por exemplo, SRSF2 e IDH2) é importante na estratificação de risco, ressaltando o papel do sequenciamento de nova geração na avaliação desses pacientes.

Tais observações levaram ao desenvolvimento de escore prognóstico MIPSS-PV, que leva em consideração quatro critérios:

  • Idade > 67 anos = 3 pontos;
  • Leucocitose ≥ 15.000/mm³ = 2 pontos;
  • Cariótipo anormal = 1 ponto;
  • Mutação SRSF2 = 2 pontos.
  • Após avaliação dos critérios, os pacientes com PV são classificados em três categorias de risco:
  • Baixo risco: 0-1 ponto (mediana de sobrevida de 24 anos);
  • Risco intermediário: 2-3 pontos (mediana de sobrevida de 13,1 anos);
  • Alto risco: > 3 pontos (mediana de sobrevida de 3,2 anos).

Apesar das informações prognósticas adicionais, a análise citogenética e o sequenciamento de nova geração não são mandatórios na prática clínica. Além disso, mais estudos ainda são necessários para validação do MIPSS-PV e identificação das anormalidades citogenéticas que impactam no prognóstico.

Leia também: Leucemia linfoblástica aguda em adultos: manejo dos efeitos adversos da asparaginase?

Em relação à evolução para mielofibrose pós-PV, pesquisadores já demonstraram que a presença de carga de alelo JAK2V617F alta (> 50%), fibrose medular ao diagnóstico e leucocitose persistente associam-se a maior risco.

Referências bibliográficas:

  • Tefferi, Ayalew, Alessandro M. Vannucchi, and Tiziano Barbui. Polycythemia vera: historical oversights, diagnostic details, and therapeutic views. Leukemia (2021): 1-13. https://www.nature.com/articles/s41375-021-01401-3
  • Tefferi, Ayalew, et al. Mutation‐enhanced international prognostic systems for essential thrombocythaemia and polycythaemia vera. British journal of haematology 189.2 (2020): 291-302. doi10.1111/bjh.16380
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